ESCOLA MATER “ECCLESIAE”
Léxico Bíblico
Vocábulos técnicos, específicos do linguajar exegético
bíblico
Gênero
literário: conjunto de normas de
estilo e de vocabulários que regem a explanação de determinado assunto. Assim,
os textos de leis têm seu expressionismo e seu estilo próprio (claro e
conciso); ao contrário, a poesia tem outro expressionismo (metafórico e
reticente); uma carta familiar diferente, por seu linguajar, de uma carta
comercial... – Como há gêneros literários na linguagem moderna, há-os também na
linguagem bíblica; a consciência disto tornou-se clara aos cristãos a partir de
fins do século passado (19); em conseqüência, hoje, quando o leitor está para
abordar o texto bíblico, deve informar-se a respeito do respectivo gênero
literário (será poesia?... parábola?...). Cada gênero literário, tendo suas
regras de expressão próprias, tem também suas regras de interpretação
particulares, de modo que não se pode entender um texto de leis como se entende
uma poesia ou uma parábola.
A definição do gênero literário de um
determinado texto não se pode fazer arbitrariamente, mas deve obedecer a
critérios científicos (exame das características do texto).
Hagiógrafo:
autor sagrado ou autor de algum livro
bíblico. Um só livro pode ter mais de um autor ou hagiógrafo.
Hermenêutica:
arte de interpretar (hermeneuein, em grego). Interpretar é
procurar compreender e explicar – o que tem de ser feito segundo critérios
objetivos e não conforme opiniões ou pareceres subjetivos. Embora a Bíblia seja
palavra de Deus, que tem eficácia santificadora própria, ela é a palavra de
Deus encarnada na palavra do homem; por isso precisa de ser entendida
primeiramente como o instrumento das ciências históricas e lingüísticas para se
perceber o sentido da roupagem que a Palavra de Deus quis assumir. Só depois de
depreender o que o autor sagrado tinha em vista exprimir com sua linguagem, é
possível passar para o plano da fé e da teologia.
Inferno: do latim infernus,
adjetivo que vem de infra, abaixo.
Inferno seria a região inferior, colocada debaixo da superfície da terra.
Significaria o cheol dos judeus antigos. Na linguagem cristã, feita abstração
de topografia ou de geografia do além, inferno significa o estado póstumo dos
que renegaram consciente e voluntariamente a Deus.
Inspiração
bíblica: distingue-se da inspiração
no sentido usual da palavra, pois não é ditado mecânico nem é comunicação de
idéias que o homem ignorava. Inspiração bíblica é a iluminação da mente de um
escritor para que, sob a luz de Deus, possa escrever, com as noções religiosas
e profanas que possui, um livro portador de autêntica mensagem divina ou um
livro que transmite fielmente o pensamento de Deus revestido de linguajar
humano.
A finalidade da inspiração bíblica é
religiosa, e não da ordem das ciências naturais.
Toda a Bíblia é inspirada de ponta a
ponta, em qualquer de suas partes.
Certas passagens bíblicas, além de
inspiradas, são também portadoras de revelação ou da comunicação de doutrinas
que o autor sagrado não conhecia através da sua cultura (Deus é Pai, Filho e
Espírito Santo, chamou-nos para o consórcio da sua vida, mandou-nos o Filho
como Redentor, etc.).
A distinção entre inspiração bíblica e
revelação se faz muito clara no livro de Jô. Este trata do sofrimento do homem
justo; por que é abatido pela doença? O autor sagrado só tinha noção do cheol;
ignorava a retribuição póstuma; Deus não lhe quis revelar a vida póstuma
consciente; mas quis inspirá-lo para escrever o livro de Jô. Isto quer dizer
que o autor procurou dentro dos limites da vida presente uma resposta para a
questão do sofrimento dos justos. Não a encontrou porque só se elucida a luz da
ressurreição e da vida póstuma, consciente. Em conseqüência, o hagiógrafo pode
dizer que o sofrimento nem sempre supõe pecados pessoais, como se fosse um
castigo. (o que já era um progresso na mentalidade de Israel); quanto ao mais,
terminou pedindo o silêncio do homem diante do mistério da dor; é certo que
Deus é mais sábio do que o homem e não se engana, mas o homem não é capaz de
abarcar os desígnios de Deus. Esta conclusão é plenamente válida, é digna de um
livro inspirado; mas não contém a revelação da ressurreição dos mortos e da
vida póstuma consciente, que só mais tarde teria lugar em Israel. Por último,
Jesus nos revelou que o sofrimento, aceito em união com Ele, é Páscoa ou
passagem para a ressurreição e a glória definitiva.
Algo de semelhante se deu com o livro do
Eclesiastes. É inspirado de ponta a ponta, mas não traz a revelação da vida
póstuma consciente, sem a qual é impossível debater o problema da felicidade,
que o hagiógrafo encara. Não obstante a conclusão do livro é verídica não só
para um judeu, mas para um leitor cristão; cf. Ecl 12,13s. Ver revelação.
Javé:
é o nome com o qual Deus se revela a
Moisés em Ex 3,14s. Pode ser interpretado de várias maneiras: a tradição dos
judeus de Alexandria, muito dados a especulações filosóficas, traduziu Javé por
ho on, Aquele que é; queriam indicar
assim o Absoluto ou o Transcendente de Deus. Todavia parece que, segundo a
concepção dos judeus da Palestina, menos propensos a elevações filosóficas, o
nome Javé significa Aquele que é fiel, que acompanha o seu
povo e lhe está sempre presente.
Lei:
na linguagem paulina designa
freqüentemente a Tora ou a lei de Moisés de modo que, quando o Apóstolo censura
a Lei (cf. Gl 2,6; 3,10.19), tem em vista não qualquer lei nem a boa ordem
pública, mas a Lei de Moisés, que era um provisório preparativo da vinda do
Cristo.
Messias:
vocábulo hebraico que significa Ungido; foi traduzido para o grego por
Christós. Eram ungidos os reis de Israel (cf. I Sm 10,1; 16,13; 2 Sm 2,4...),
que por isso traziam o nome de “Ungidos de Javé”. A unção significa relação
particular entre o Senhor Deus e o ungido, que assim era revestido de
autoridade especial e inviolável (cf. I Sm 24,7; 26,9.11...). Ungidos eram
também os sacerdotes em Israel (cf. Ex 28,41; Lv 10,7; Nm 3,3). Aos profetas se
aplicava uma unção não em sentido próprio, mas em sentido metafórico (cf. I Rs
19,19; II Rs 2,9-15). – Visto que o Salvador prometido Gn 3,15 seria Rei, filho
de Davi (cf. II Sm 7,12-16), Sacerdote (cf. Hb 7,1-25; Gn 14,17-20) e Profeta,
o título de Ungido lhe foi atribuído
na literatura judaica e nos escritos do Novo Testamento (cf. Jo 1,41; 4,25).
Jesus foi ungido com o Espírito Santo e com poder (At. 10,38); Ele mesmo
aplicou a Si o texto de Is 61,1, apresentando-se como o Ungido que veio anunciar aos povos a Boa-Nova (cf. Lc 4,18-21).
Com o tempo, a palavra Ungido, que era
um adjetivo próprio, justaposto a Jesus;
donde Jesus Cristo, e não Jesus o Cristo.
Midraxe é uma narração de fundo histórico, ornamentada pelo
autor sagrado para servir à instrução teológica e à edificação dos seus
leitores. O autor conta o fato de modo a pôr em relevo o valor ou o significado
religioso desse fato. A sua intenção não é estritamente a de um cronista, mas
de um catequista ou teólogo. Como exemplo, citemos o caso do maná: em Nm 11,4-9
é apresentado como alimento insípido e pouco atraente; mas em Sb 16,20s é tido
como cheio de sabor, adaptando-se ao paladar dos que comiam. Parece haver
contradição; na verdade não a há: o autor de Nm escreve uma narração de cronista, ao passo que o de Sb nos
apresenta o sentido teológico do maná num midraxe:
o maná era pão delicioso não por seu paladar, mas porque era o penhor da
entrada do povo na Terra Prometida; visto no contexto da história da salvação,
o maná foi delicioso.
Parábola: história fictícia que serve para ilustrar uma verdade
teológica. É, pois, uma longa comparação; caracteriza-se pelas fórmulas “O reino
dos céus é semelhante..., é como...”. A parábola nunca aconteceu. Deve-se
interpretar a parábola procurando a linha mestra do seu ensinamento e
transpondo tal mensagem para o plano da fé. Assim em Lc 15,11-32 a bondade do Pai para com o
filho pródigo ilustra a misericórdia de Deus para com os pecadores; Lc 10,30-37 a solicitude caridosa do
bom samaritano ilustra a maneira como devemos tratar o próximo, qualquer que
seja a sua condição humana ou social.
A alegoria
carece da fórmula “é semelhante, é como...” Exprime diretamente o nexo entre o
sujeito e o predicado: “Eu sou o bom Pastor” (Jo 10,11), “Eu sou a videira
verdadeira” (Jo 15,1... Na alegoria os pormenores da imagem podem ser aplicados
ao plano transcendental com mais rigor do que na parábola (esta geralmente fala
apenas por seu fio condutor).
Parusia:
visita que o Imperador Romano fazia
às cidades do Império; tal aparição do Imperador era sempre ocasião de alegria
festiva. – Ora os cristãos assumiram este vocábulo para designar a segundo
vinda de Cristo ao mundo a fim de consumar a história; Ele virá como Senhor, Kyrios, Imperador a fim de julgar o
mundo e restaurar plenamente a ordem.
Presbítero: ver Bispo.
Promessa:
no vocábulo paulino, é a promessa,
feita por Deus a Abraão, de que sua posteridade seria numerosa e por ela todos
os povos receberiam a bênção (= o Messias); cf. Gl 3,16.18. Tal promessa se cumpriu
em Cristo; cf. II Cor 1,20.
Querigma: ver catecúmeno.
Revelação:
A Bíblia nos dá a saber que Deus
falou aos homens comunicando-lhes o mistério da sua vida trinitária e o seu
desígnio de salvação, centrado em Cristo Jesus. Nunca
os homens chegariam por si a conhecer tais verdades. Por isto o judaísmo e o
Cristianismo são religiões reveladas.
A Bíblia contém a revelação de Deus aos homens,
mas nem todas as páginas da Bíblia, embora inspiradas, são portadora de
revelação divina. Note-se, por exemplo, que em Is 7,14 está predito que uma
virgem conceberia e daria à luz um filho: isto foi consignado no texto sagrado
por efeito de dois carismas (o da revelação e o da inspiração); mas, quando Mt 1,20-23 e Lc 1,26-38 nos dizem que a
virgem concebeu e deu à luz um filho, já não escrevem por efeito de revelação
(o fato ocorrera e era notório), mas unicamente por efeito do dom da inspiração
bíblica. – Toda profecia é fruto de revelação divina.
As razões de diversidade de numeração
são históricas e de pouca monta.
Em nossas aulas indicaremos sempre as
duas numerações de cada salmo, quando as houver; a anterior será a da Vulgata,
e a posterior a do texto hebraico.
Satã
ou Satanás: termo hebraico que
significa “adversário”. Satã podia ser o indivíduo que diante de um tribunal
exercesse o papel de acusador (cf. Sl 108,6). Tal vocábulo, aos poucos a partir
do século V a.C., foi reservado a um anjo que Deus criou bom, mas que se
perverteu pelo pecado e se tornou adversário ou tentador do gênero humano; cf.
Jô 1,6-2,7; I Cr 21,1. Foi identificado com a serpente de Gn 3,1. (cf. Sb
2,24). Portanto Satã não é uma figura mitológica nem é a realidade neutra do
Mal, mas é uma criatura inteligente, incorpórea, que o Criador fez para sua
glória e que se afastou livremente de Deus; atualmente recebe do Senhor
autorização para provar os homens, dando-lhes ocasião de acrisolar e corroborar
a sua fidelidade a Deus; cf. Rm 16,20; Ef 6,16; I Pd 5,8. Com Satã muitos
outros anjos se perverteram pelo pecado e são atualmente chamados “anjos maus”
ou “demônios”. Estes estão subordinados a Deus; cf. Ap 12,7-17. S. Agostinho
nos diz que Satã é um cão acorrentado, que pode latir fortemente, mas só
consegue morder a quem se lhe chega perto ou a quem se lhe entrega.
Semitas: são os descendentes de Sem, filhos de Noé; cf. Gn
10,22-30. Correspondem a diversos povos, entre os quais o hebreu ou israelita,
o assírio, o babilônico, o etíope, o fenício, o púnico,m o moabítico, o
aramaico.
Sínodo:
congresso de rabinos ou de bispos.
Tenha-se em vista o Sínodo de Jâmnia ou Jabnes, no qual os rabinos, por volta
de 100 a .C.,
definiram quatro critérios para reconhecer um livro sagrado como inspirado por
Deus e canônico: fosse escrito em hebraico (não em aramaico nem em grego), na
terra de Israel (não no estrangeiro), antes de Esdras (século V a.C.), em
conformidade com a lei de Moisés. – Tenha-se em vista também o Sínodo de Trulos
II (Constantinopla), que em 692 no Oriente definiu o cânon bíblico, incluindo
os sete livros deuterocanônicos que os judeus em Jâmnia não aceitaram.
Teofania:
etimologicamente, manifestação de
Deus, em grego. Ocorre ,
por exemplo, na sarça ardente em favor de Moisés (Ex 3,2), no final do livro de
Jó (38,1-42,6), antes da paixão de Jesus (Jo 12,27-30).
Testamento:
A Bíblia consta de dois testamentos:
o Antigo e o Novo. A razão desta divisão e nomenclatura é a seguinte: Os
judeus, movidos pelo próprio Deus, designavam as suas relações com Javé como
sendo um Berith (= aliança); por isso falavam dos livros
da aliança. Todavia, nos séculos III/II a. C., quando se fez a versão da
Bíblia hebraica para o grego em Alexandria, os intérpretes traduziram Berith por diatheke (= disposição); queriam de esta maneira ressalvar a
unicidade e soberania de Deus; na verdade, quem faz aliança com alguém, é par
ou igual com esse alguém, ao passo que quem faz uma disposição é soberano ou
Senhor. Assim os livros sagrados de Israel foram chamados livros da diatheke ou
da disposição (de Deus em favor dos homens). Quando a palavra diatheke foi traduzida para o latim
entre os cristãos, estes usaram o vocábulo testamentum
(= disposição que se torna válida em caso de morte do testador). Recorreram à
palavra testamentum, porque ficou comprovado
que a disposição de Deus em favor dos homens só se tornou plenamente, válido e
eficiente mediante a morte de Cristo. Assim os livros sagrados, entre os
cristãos, foram distribuídos em duas categorias: os da Aliança (ou testamento)
antiga e os da nova Aliança ou do novo Testamento; cf. II Cor 3,14s.
Traduções
gregas do Antigo Testamento. Além da
tradução dita dos Setenta, que será apresentado no módulo III deste Curso (1ª
Etapa), devem ser mencionadas as de Teodocião, Áquila e Símaco.
Teodocião
é um prosélito ou pagão convertido ao
judaísmo, que traduziu o Antigo Testamento para o grego no século II d. C., a
fim de tentar extinguir o uso do texto dos LXX. Esta tradução, realizada em
Alexandria entre 250 e 100 a .
C., era muito utilizada pelos Cristãos para provar a messianidade de Jesus.
Visto que isto desagradava aos judeus, Teodocião se dispôs a fazer nova versão,
que é mais propriamente uma versão retocada do texto dos LXX. O texto de
Teodocião teve importância para os cristãos, pois a partir dele se fez a
tradução latina dos partes deuterocanônicas do livro de Daniel.
Áquila,
também no século II, fez uma
autêntica tradução grega do A. T. O seu texto se prende muito à letra do
hebraico, esforçando-se por guardar em gregas expressões tipicamente semitas.
Símaco
é o terceiro tradutor do Antigo
Testamento para o grego. A sua versão é mais livre do que as anteriores;
procura levar em conta o espírito e as peculiaridades da língua grega. Tanto
Símaco como Áquila tentavam suplantar o uso dos LXX.
Vulgata
é a tradução latina da Bíblia que se
deve a S. Jerônimo (+ 421). No século IV era grande o número de traduções
latinas das Escrituras, todavia apresentavam grandes deficiências de forma e de
conteúdo. Por isso o Papa S. Damaso pediu a S. Jerônimo preparasse uma versão
nova e fiel dos livros sagrados. Este sábio, de grande erudição na sua época,
aplicou-se à tarefa entre 384 e 406. Não chegou a traduzir de novo o texto do
Novo Testamento, mas fez a revisão dos textos já existentes cotejando-os com
bons manuscritos gregos. Para traduzir o Antigo Testamento, Jerônimo
estabeleceu-se na Terra Santa, onde aprendeu o hebraico com os rabinos e
traduziu em Belém todo o Antigo Testamento, menos Br, I e II Mc, Eclo e Sb.
A tradução de S. Jerônimo aos poucos
substituiu as anteriores, de modo a chamar-se Vulgata editio ou edição
divulgada. Tornou a tradução oficial da Igreja até o Concílio do Vaticano II
(1962-65). Todavia a tradução de S. Jerônimo não podia deixar de ter suas
falhas, pois foi feita em época na qual não havia os recursos arqueológicos,
históricos, lingüísticos. .. de nossos tempos. Por isso, após o Concílio do
Vaticano II, Paulo VIU mandou refazer a tradução latina dos livros sagrados,
que, uma vez pronta, é chamada a
Neo-Vulgata.
Obs.: Trata-se de uma cópia fiel
do Curso de Formação bíblica da ESCOLA “MATER ECCLESIAE”, elaborado pelo Pe.
Estevão Tavares Bettencourt O. S. B.
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